13/03/2023 14h51min - Internacional
um ano atrás

Como suposto espião russo 'esquentou' documentos em cartório brasileiro, segundo a PF

Suspeito foi preso quando tentava entrar na Holanda

Foto: GETTY IMAGES ► 

Odilo Balta / jornalcorreiodosul@terra.com.br
Fonte: BBC News


Documentos obtidos pela BBC News Brasil apontam que esses são os elementos do mais novo episódio envolvendo o russo Sergey Vladimirovich Cherkasov, detido no Brasil e apontado por autoridades de diferentes países como um agente secreto da Rússia.

Condenado no Brasil por falsificação de documentos, ele surpreendeu as autoridades brasileiras pela forma como conseguiu obter toda uma leva de documentos de identificação falsos e ficou praticamente indetectável no país por quase uma década.

Nos últimos meses, porém, começaram a surgir pistas de parte do que seria a rede que lhe deu suporte para falsificar documentos e manter sua identidade de cidadão brasileiro normal.

Elas apontam que Sergey teria tido a ajuda de uma escrevente de cartório brasileira para conseguir a anulação de multas eleitorais e a liberação documental para a compra de um apartamento em São Paulo. Pela ajuda, ele teria presenteado a mulher com um colar da marca Swarovski avaliado em US$ 400, pouco mais de R$ 2 mil.

Sergey foi preso em abril de 2022 após tentar, sem sucesso, entrar na Holanda. As autoridades do país europeu apontam que se fazia passar por Victor Muller Ferreira, um cidadão brasileiro que tinha conseguido um estágio no Tribunal Penal Internacional, em Haia.

O serviço de inteligência holandês afirma que em vez de ser um estudante brasileiro, Victor era, na realidade, Sergey, um agente secreto do FSB, um dos serviços de inteligência da Rússia.

Ao chegar ao Brasil, ele foi preso, processado e condenado a 15 anos de prisão por uso de documentos falsos. Aqui, ele admitiu ser russo, mas negou qualquer ligação com os serviços de inteligência russos.

Alertada sobre a possibilidade de ter um espião internacional em suas mãos, a Polícia Federal passou a investigar Cherkasov e conseguiu apreender documentos e dispositivos eletrônicos escondidos em uma área de mata em Cotia (SP).

Esses dispositivos, acreditam os investigadores, eram usados para o russo deixar mensagens e passar relatórios sobre suas atividades aos seus "controladores" em território nacional.

Preso, investigado e alvo da Rússia

Os elementos colhidos pelas autoridades holandesas apontam que Cherkasov faria parte de um grupo específico de agentes de inteligência russos.

Usando sua identidade brasileira, segundo as investigações, Cherkasov morou na Irlanda e nos Estados Unidos onde fez cursos em universidades dos dois países. Foi com seus documentos falsos brasileiros que ele obteve vistos emitidos por autoridades americanas.

Em outubro de 2022, um outro caso semelhante ao de Cherkasov foi revelado pelas autoridades da Noruega.

A polícia local prendeu um homem supostamente brasileiro que atuava como pesquisador em um centro que estuda questões relacionadas ao Ártico e ameaças híbridas.

Do ponto de vista geopolítico, a Noruega é considerada importante para a Rússia por conta da proximidade com o país e pelo fato de o país fazer parte da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).

O caso de Cherkasov chamou ainda mais atenção a partir de agosto de 2022, quando o governo da Rússia pediu a sua extradição. No pedido, as autoridades russas afirmam que ele seria investigado no país por crimes relacionados ao tráfico de drogas.

O que despertou a curiosidade de pessoas familiarizadas com o caso no Brasil foi o fato de que Cherkasov se manifestou favorável à sua extradição para a Rússia uma vez que as penas às quais ele pode estar sujeito em seu país-natal são maiores que aquelas às quais ele estaria sujeito no Brasil.

O pedido de extradição, agora, depende do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF). Ainda não há data prevista para o julgamento.

A reportagem da BBC News Brasil procurou a Defensoria Pública da União (DPU), que atua no caso da extradição de Cherkasov. Por meio de nota, o órgão disse que não poderia se manifestar sobre eventuais denúncias contra ele em outras instâncias da Justiça.

A reportagem também fez contato com advogados que começaram a defendê-lo logo que ele foi preso, mas não obteve retorno.

Por: Leandro Prazeres da BBC News em Brasília - DF